segunda-feira, 9 de maio de 2011

Praça Clarice Lispector

Praça com manhã agitada...
O senhor grisalho que vende flores está fazendo ótimos negócios. Já o vi despachando vários clientes. Sinto, daqui de onde estou sentado, o aroma agradável de suas flores naturais. Elas são coloridas e de diversas formas.
Um ceguinho hoje resolveu parar na praça, viola na mão, Mílton Nascimento na voz, sentimentos puros no coração. Os olhos por trás dos óculos pretos não conseguem enxergar o dia lindo. "Todo artista tem que ir aonde o povo está", canta o cego sem importar-se com o tilintar das moedas jogadas pelos traseuntes. Até o senhor das flores veio lhe deixar algum dinheiro.
Mais à frente do cego, um grupo de senhores joga dominó num mesa de pedra. Noutro canto há o jogo de gamão bem disputados por mais dois senhores. As damas são mexidas mais à direita, por dois taxistas observados por alguns companheiros.
Alguns pombos voam e voltam. Uns vão, outros vêm
...

quinta-feira, 5 de maio de 2011

As flores que colhíamos juntos




As flores que colhíamos juntos

Você não pode esquecer
Das flores que colhemos juntos
Naquele campo vasto
Com muitos pássaros
E um vento frio
Soprando sobre nós
Quando ainda éramos tão jovens.

Você não deve esquecer
Das flores do seu vestido
Estampas coloridas
Como as flores no campo
Que colhíamos juntos
Com aquele vento frio
Soprando sobre nós
Levando nossa inocência.

Era como num sonho
Quando colhíamos flores
E você lutava contra o vento
Para não levantar o seu vestido
Estampado com flores
As mesmas flores do campo
Que colhíamos juntos

Não era um sonho
Eram verdadeiras as flores
Você é a minha verdade
Desde que éramos crianças
E brincávamos de colher flores
Num campo vasto
Com pássaros e um vento frio
Tentando levantar o seu vestido
Estampado com as mesmas flores
Que colhíamos juntos.

Quando éramos inocentes
Ríamos juntos...

sábado, 29 de maio de 2010

Os dias às vezes mudam e são como se fossem de outra estação.

Acabei de falar isso para uma grande amiga, pessoa que trago bem próxima do meu coração. Pedi a essa figura que, se por acaso, a vida me presentear com um oásis verdejante lindo, produtivo e de água límpida, ela esteja sempre me lembrando que "os dias às vezes mudam e são como se fossem de outra estação".
Quem sabe eu possa separar duas coisas: riqueza de soberba, e amizade fiel de bajulação barata.
Talvez, assim, eu poderei lembrar dos desertos que rodeiam os oásis e consiga fincar as estacas da humildade como bases para a minha tenda.

domingo, 15 de novembro de 2009

Isso é cagado e cuspido paisagem do interior

Um bêbado sendo insultado
Na reunião duma esquina
Só de alma masculina
Dizendo-lhe que tá cagado.
Um terço todo rezado
Na missa do agricultor
Gente simples no fervor
Pela chuva agradecido
ISSO É CAGADO E CUSPIDO
PAISAGEM DO INTERIOR

Um jumento amarrado
Debaixo duma mangueira
Sem vergonha e sem besteira
Ficando todo ouriçado.
Com olhar arregalado
Moça véia e sem pudor
Passando grita de dor
Por aquilo tudo estruído
ISSO É CAGADO E CUSPIDO
PAISAGEM DO INTERIOR.

Em homenagem ao grande nordestino e poeta,ator e compositor, matuto de primeira linhagem, Jessier Quirino, que está com livro e cd novos na praça.

domingo, 8 de novembro de 2009

Se eu pudesse encontrar quem mais amei

Vi meu filho num canto desolado

Expressando no olhar enorme tristeza

Perguntei-lhe o porquê, queri'a certeza,

Do que lhe deixava assim tão acanhado.

Respondeu-me: papai, tô abalado,

Minha amada partiu, não vem mais, não!

Agarrado aqui ao meu violão

Assobio baixinho o que alto cantei

Se eu pudesse encontrar quem mais amei

Livraria da dor meu coração.


Parte do poema cujo título segue acima.

Jesus de Miúdo.

(Março de 2008)

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Viagem ao nada

Eu viajo sem saber direito para aonde vou
Me afasto de mim e de meus sentimentos
Quero a solidão, estática sem impedimentos
Para entender, por fim, quem realmente sou.
Ultrapasso as barreiras de onde eu estou
Indo além de um lugar que eu não sei ao certo
Se é paraíso, inferno, jardim de flores, ou deserto
Augurando descobrir, sozinho, o que me fará feliz
E o meu espírito, tadinho, chega e me diz:
- Se afaste de tudo, mas fique aqui por perto.
Eu viajo sem saber direito, mas quero o céu aberto
Com estrelas que iluminem o ir a esse meu exílio
Servindo de guias nessa busca por novo domicílio
Onde a minha alma descansará com amor, decerto
E o meu eu seja por fim, por mim, assim, descoberto
Quero um lugar onde eu não tenha mais dificuldade
De expressar-me, ser compreendido, em minha castidade
Quero gritar coisas que jamais gritei
Amar, viver, sem as culpas às quais sempre me dei
E por fim gargalhar alto, louco, de tal liberdade.
E se o meu espírito, tadinho, pedir por caridade
Que eu retorne aos lugares do passado ido
Que eu, humilde, saiba e tenha compreendido
Que o grande monstro nascido da verdade
Nessa tentativa de, de mim mesmo ter fugido
Seja a descoberta que o sofrimento gera a saudade.
Então, ao meu espírito falarei com desenvoltura
Se acalme, seja plácido, seja espírito apenas
Pois o meu eu, mesmo longe, vive hoje lindas cenas
E perdeu com a liberdade, o dom da amargura.


Jesus de Miúdo.
Set/09.

Rio e mar. Mar e rio...

Sei que ando meio relapso com esse espaço, mas prometo que vou atualizá-lo com maior frequência. Segue algo já publicado no www.acaridomeuamor.nafoto.net

(Escrito no sábado 24 de outubro, à noite, em homenagem à Professora Ana Lúcia Sampaio)

Hoje à tarde tomei rumos há muito não procurados. Confesso que saí de casa meio sem ermo, andando para ficar só. Desci pela rua principal retribuindo o carinho das pessoas que me cumprimentavam com palavras rápidas ou, simplesmente, com gestos em acenos de cabeça ou de mãos. Alguns polegares para cima, outras vezes dois dedos em foram de “V”.
Quando alguém tentou me acompanhar e puxar conversa, não fui grosso. Mas procurei ir por onde ele não ia, seguindo meu desejado passeio solitário, sentindo o calor de trinta e seis graus, o sol queimando meu rosto, o vento quente soprando e assanhando meus cabelos... literalmente sem lenço e sem documento algum.
De repente estava sobre a ponte que separa nossa pequena cidade, Norte numa cabeceira, Sul na outra, Rio Acauã passando por baixo dos meus pés firmes sobre o concreto da construção há vinte e seis anos inaugurada.
Desci pela cabeceira sul e me vi sobre a areia fina da margem do dito rio. Tirei as sandálias, arregacei as pernas da calça jean’s, desbotada pelos anos, tecido macio, fino por tantas lavagens sofridas, pondo-as um pouco abaixo dos joelhos. Caminhei por aquele ponto onde a água beija de leve a areia, mal cobrindo meu pé direito, mais na areia que na água, entretanto engolindo meu pé esquerdo sempre que esse tocava o chão. Caminhei ao contrário das águas.
Fui sentar-me numa pedra, à sombra de uma Ingazeira, a mesma pedra de onde, quando ainda um menino teimoso e desobediente, às vezes, não considerando as advertências maternas, dela me atirava num mergulho para sair lá embaixo, correnteza me levando como um peixe que não tem piracema para motivá-lo em lutar contra o fluxo da enchente.
Sentado ali me lembrei de tantas coisas passadas... e os anos foram sendo exibidos na tela das minhas lembranças, retornando cenas em memórias que se eu pudesse reviveria todos os dias. De repente, não tinha mais do que me lembrar. Cheguei ao hoje.
Olhei rio acima, até onde a minha vista podia alcançar. Rio torto, pedras em seu caminho, contornadas sem nenhuma força. Tantas pedras... vencidas pelo rio tão maravilhosamente caudaloso.
Lá longe a serra ainda se veste de mata verde pelas chuvas que esse ano foram benfazejas. Percebi que tudo ainda está verde. Tudo verde... que verde! Que serra! Grande, majestosa! Nem por isso venceu a teimosia das águas e, em certo ponto, se fez garganta para que o rio pudesse passar, se fez espécie de cânion para a passagem das águas.
“Rio torto”, pensei. Como são todos os rios.
Deitei-me na pedra, fechei meus olhos. Lá às minhas costas o sol começava a baixar, perdendo a força, o brilho se tornando avermelhado, já não refletido em nenhum ponto nas águas do rio. Não daquele lugar em que eu estava.
Confesso que certas glândulas me turvariam os olhos, se abertos estivessem, quando senti rolarem duas aguinhas impertinentes e que logo viraram quatro. Se mais tempo ali permanecesse, tenho certeza, o rio aumentaria um pouquinho em seu volume.
Me pus de pé sobre a pedra. Tirei minha camiseta, joguei-a de qualquer jeito sobre as sandálias, mirei as águas do velho Acauã, juntei meus pés, tomei fôlego e pulei.
Após o mergulho, me deixei levar um pouco pela correnteza para, só depois, procurar a margem de terra firme. Saí alguns metros à frente. Por um momento me vi menino novamente, não fosse pela calça jean’s substituindo o calçãozinho de tecido barato que eu usava quando mais novo.
Novamente sobre a pedra, percebi a água que escorria de mim, lambia a rocha e se juntava ás outras águas rio abaixo, levando por certo algum pingo salgado que rolara da minha face.
“Esse rio vai dar no mar”, pensei. Como vão todos os rios. E aí, lá no mar transformar-se-á em nuvem novamente, nuvem em chuva, chuva em água, água na terra, da terra para o rio e do rio para o mar! Rio e mar. Mar humilde, vivendo abaixo do rio apenas para recebê-lo. Mar. Rio. Rio e mar... um ciclo perfeito e tudo tem o seu recomeço. A ida, a volta, para a ida, à volta, a ida...
Confesso que eu agora creio em recomeço. Há, sim, muitos rios e vários mares, alguns oceanos; todos feitos rios, todos feitos mares. Porém, hoje descobri que é possível recomeçar.
Sempre é!
E a citação que hoje me inspira é: “Todo caminho tem... tem ida e volta”.

domingo, 17 de maio de 2009

Pôrra-Louca

Falar com os olhos
Morder com as mãos
Abraçar com a boca...
Isso não é paixão?

- Que merda é essa? - perguntou o gari que passava varrendo a rua, todos os dias, assustado com o que acabara de ouvir na voz feminina do jovem alto.

sexta-feira, 15 de maio de 2009

Por tudo que for - plágio em prosa de Lobão

... e depois a luz da rua que adentrava meu quarto pela janela de vidro se apagou. Já não adiantava ficar de olhos abertos ou fechados. Tanto fazia. Mas nas imagens que vinham como que pelos olhos, fechados, o dia estava claro e você estava segurando a minha mão. Mas de repente uma nuvem preta tomou conta da mente, você se foi. Sem você é tão ruim. O prazer não tem satisfação, não há nada além do nada. Não faz sentido, sem você... E saber que quem errou fui eu, me tirava a respiração. Fui dormir fingindo que a solidão era a melhor companheira. Ah! Doce ilusão pensar em você batendo a porta e chamando meu nome. Só me restava tentar dormir. Dormir para tentar sonhar com você segurando a minha mão, caminhando junto a mim, num dia claro. Não dava mais. Ali naquele instante, não dava mais. Sentia que você havia ido para sempre e eu fui dormir tentando acreditar que a solidão era, de fato, a minha melhor companheira. Olhei pela janela do quarto, sem saber quanto tempo já passara. O dia estava claro, mas você não caminhava ao meu lado, segurando a minha mão. Fechei os olhos novamente e você nem apareceu mais. Sem você é tão ruim.

quinta-feira, 14 de maio de 2009

Silêncio

... então, ela olhando de lado por sobre o ombro esquerdo, avistando o vale que se perdia na vista, inquietando-se por um momento por tudo que vivia ali, perguntou-lhe de súbito:
- E o silêncio, para você, o que é?
Ele olhou para ela, percebendo que seus olhos estavam longe, mas sua mente esperava por uma resposta. Pegou um pequeno galho seco e levou à boca. Mordeu um pouco, sentiu um gosto amargo, apertou os olhos como querendo avistar mais longe do que o possível e por fim respondeu olhando o mesmo vale aberto aos olhos de ambos:
- É a mais fria das armas que matam e o mais bruto dos descasos.
Calaram-se os dois.